Por TAYNARA MAGAROTTO
SÃO PAULO - Não é segredo para ninguém que o Brasil produz novelas como nenhum outro lugar do mundo. Nossas tramas são assistidas por milhões de pessoas e elogiadas no exterior. Desta mesma forma, os Estados Unidos é líder quando o assunto é criar seriados e minisséries. As atrações de maior destaque são exibidas em vários países e por vários anos - até depois do final do programa, como é o caso de "Friends".
Acontece que, de uns tempos para cá, o Brasil começou a investir mais em minisséries e séries. O que era uma marca exclusiva da terra do Tio Sam, agora está se tornando uma das novidades das telinhas brasileiras. O primeiro e o segundo passo foram dados: a vontade de se criar por aqui existe e já foi colocada em prática. O "x" da questão é apresentar esse novo gênero ao telespectador e fazer com que ele se familiarize-se com ele.
Para isso, só pesquisando e testando. E o que mais se vê por aí é o investimento em humor. Mesmo que os seriados e minisséries de drama e ação dêem mais audiência e rendam mais comentários junto ao público, as emissoras aparecem a cada momento com uma nova atração de diversão – e que muitas vezes não dá tanto ibope quanto se apostava.
Podemos citar, como exemplo, “Tudo Novo De Novo”. O drama familiar, estrelado por Júlia Lemmertz e Marco Ricca, discutia as relações de adultos em meio a separações, casos e tratamento com filhos. No ar às noites de sextas-feiras, o seriado tinha tudo para dar certo, mas não vingou na Globo. Por outro lado, “Aline” também era tido como um grande sucesso global. O seriado de humor foi bem no primeiro ano, ganhou uma segunda temporada, mas em três capítulos já acendia a lanterninha amarela da emissora. Não vingou!
Ao mesmo tempo que “Batendo Ponto”, que é um seriado de humor estrelado por nomes como Ingrid Guimarães e Alexandre Nero, não alcançou bons índices de audiência, “Força-Tarefa” – que é pura ação – já está indo para sua terceira temporada.
O Famosidades abriu uma discussão sobre o que faz com que os programa brasileiros dêem certo no país. Será que o gênero é o principal fator de sucesso, os problemas de horário da grade são os que mais influenciam na permanência da atração no ar, ou o público mesmo que não está acostumado com a novidade? Confira a opinião de atores e autores nas próximas páginas!
Divulgação
Marcílio Moraes, que é autor de sucessos como “Dona Flor e Seus Dois Maridos” (Globo), “Chiquinha Gonzaga” (Globo) e “A Lei e o Crime” (foto acima), da Record, conversou com o Famosidades. Para ele, ainda estamos engatinhando no assunto. “Acho que produzimos poucos seriados no Brasil, até hoje, para fazer uma avaliação do desempenho. A Globo tem feito alguns, mas de poucos episódios e exibidos fora do horário nobre. Não sei se dá pra dizer se foram sucesso ou fracasso”, opinou.
Além disso, o autor afirmou que o horário é algo que pode se considerar importante quando o assunto é televisão: “Eu escrevi ‘A Lei e o Crime’ para a Record. Foram 23 episódios exibidos depois das 23 horas. O resultado foi muito bom, tanto em termos de público quanto de audiência. Se eu tivesse oportunidade de fazer um seriado para o horário nobre, 21 horas, digamos, tenho absoluta certeza de que seria sucesso”.
“Acho que na comparação com os seriados americanos, há que considerar que lá são exibidos em horários mais favoráveis que aqui. No Brasil, todo o horário nobre é ocupado pelas novelas”, pontuou.
Quem concorda é Pedro Neschling. Com uma bagagem de autor, ator e diretor, ele contou que as novelas ainda tomam conta dos horários de maior audiência no Brasil. “A grade de televisão brasileira há décadas é moldada em torno dos tradicionais horários de novelas. O público em geral está acostumado com isso, com o formato, com o estilo. Temos muitos casos de novelas que começam mal e vão se acertando durante o percurso, acabam como sucessos. Nossa produção de seriados é relativamente recente, especialmente nesse regime de temporadas que a Globo vem implantando nos últimos anos. Ainda vai demorar um bocado para o público se acostumar, e também para a própria emissora entender a melhor forma de encontrar o público específico para cada programa. É preciso uma certa dose de paciência e muito investimento”, avaliou.
Questionado sobre o sucesso incerto das minisséries e seriados brasileiras, o ator, humorista e roteirista Marcius Melhem disse que não vê a situação desta forma: “Sucesso incerto qualquer produto tem. Inclusive nos Estados Unidos muitas séries são criadas, fracassam e saem do ar rapidamente. Como geralmente as de sucesso chegam aqui, tendemos a achar que tudo que é seriado lá dá certo. Mas não é assim. Lógico que, como eles têm o hábito e o ‘know how’ de produzir seriado, isso está mais no DNA do americano, como a novela está no nosso”.
Montagem Famosidades
Sobre a abordagem do humor sempre muito recorrente nas atrações das emissoras do Brasil – especialmente na Globo e na Record (as duas maiores do país) -, Marcílio Moraes ressaltou que o investimento na “risada” faz parte de como a sociedade é interpretada.
“Talvez a comédia seja mais forte na nossa tradição dramatúrgica. Também se pode considerar que as emissoras julgam que o drama já esteja bem representado nas novelas. Também não vamos esquecer que as grandes emissoras nem sempre acertam nas suas decisões. De um modo geral, há pouca ousadia na televisão brasileira, por parte das suas direções”, disparou ele, que ainda ressaltou: “Não sei se esta tendência vai continuar se impondo. Hoje já temos seriados policiais de boa qualidade”.
Pedro Neschling apontou que o brasileiro está mais acostumado com a comédia, e que para que surja o investimento em outro gênero é necessário uma nova abordagem, com diferente frequência.
“Os seriados brasileiros até bem pouco tempo atrás eram todos semanais, durante o ano inteiro, por anos. A comédia de situação acaba funcionando muito melhor nesses casos. Para investir em outros gêneros é necessária uma outra forma de abordagem, outra periodicidade. Há inúmeros sucessos de seriados lá fora que têm temporadas anuais de 12 episódios, por anos. Depois de exibidos na TV, esses programas têm uma enorme sobrevida sendo vendidos para outros países. Essa implantação vai levar um tempo a ser compreendida pelo grande público”, afirmou.
Para Marcius Melhem, a “comédia, o entretenimento pela diversão e pelo riso colam mais no gosto do público”. Pelo que estamos vendo, vale então arriscarmos mais na diversão para garantir a conquista do público? Isso também. Marcílio Moraes está aqui para não nos deixar esquecer de um ponto muito importante: a trama.
“Há inúmeros fatores importantes para o desempenho de uma atração, inclusive a grade e o gênero. Mas eu acredito que o fundamental é a história. Quando se tem uma história cativante, narrada com boa dramaturgia, o público acaba embarcando, mesmo que o horário e a inserção na grade sejam inapropriados”, apontou o autor.
Divulgação/TV Globo
Já Neschling mostrou não ter dúvidas quanto a isso. Para o ator, o horário de exibição de um programa e sua concorrência são fatores “primordiais para seu sucesso ou não”. “Não adianta querer colocar um programa mais ‘cabeça’ para competir com a loucura de um fim de noite de domingo, onde há bundas rebolando pra cima e pra baixo...”, ressaltou, cômico.
Além disso, o ator falou sobre o seriado “Aline”, o qual estrelou ao lado de Maria Flor e Bernardo Marinho. A atração foi bem em sua primeira temporada, mas marcou baixos índices de audiência na segunda e foi retirada rapidamente da programação. “A audiência do piloto de ‘Aline’ foi espetacular. A primeira temporada também teve excelentes índices. A segunda ia bastante bem também, com exceção de algumas praças, como quase todos os programas no ar hoje em dia. A decisão de encurtar a exibição da temporada foi na Globo, e só eles podem responder pelos motivos”, ponderou.
Melhem foi enfático ao negar que o gênero e a grade dos seriados são essenciais para o sucesso de uma atração televisiva: “O que determina a audiência é um misto de qualidade de texto, direção, interpretação, produção... e o que ninguém controla: o gosto do público!”.
O gosto do público, como disse Marcius Melhem, não é algo palpável. Marcílio Moraes concorda com a colocação, e ressalta que o sucesso de um seriado “é inatingível”.
“A gente só sabe se um programa deu certo ou não quando ele vai ao ar. Mas eu arriscaria dizer que o que falta, em termos de seriado, é mais investimento no formato. No Brasil, tanto os artistas – autores, diretores, atores, técnicos – quando o público estão pouco familiarizados com a dramaturgia própria do seriado, que tem que ser mais concisa, rigorosa e direta. O vício da novela ainda é muito forte, porque é a nossa tradição de mais de 40 anos”, finalizou o autor.